Simulação (Grupo 6) - Advogados da empresa municipal quanto à venda

 

Alegações iniciais

Meritíssimos Juízes, Senhores Doutores Advogados,

A equipa aqui presente, em representação da empresa municipal “Linha Mais Próxima”, pretende evidenciar que as acusações feitas pela Associação de Cabeleireiros da Linha, são, não só falsas, como também injustas. Jamais se poderia condenar a Administração, por procurar o bem-estar da sua comunidade, tendo por objetivo a “alegria de viver” dos habitantes do Concelho, numa fase tão negra, solitária e degradante como foram os meses de confinamento pela pandemia de Covid-19.

A única atuação corruptiva evidente neste processo de venda seria mesmo a tentativa da Associação de pegar num ato valioso da Administração, que tanto serviu a todos no momento de necessidade, e tornar o seu fim de atividade em algo pecaminoso. 

Questões de facto

1.      Instalação de um salão de cabeleireiro, num espaço antes utilizado como loja municipal. A cedência do edifício (antiga loja), a compra do equipamento (vindo de França, dotado de um sistema antivírus, assim como fardas especiais imunizadoras para o pessoal e para os utentes), bem como o pagamento dos salários de uma equipa de 30 cabeleireiros, da empresa “Revivre Paris Ailleurs”, são efetuados através da empresa municipal “Linha Mais Próxima”.

 

2.      Venda da antiga loja e do equipamento referido, pela empresa municipal “Linha Mais Próxima”, pela quantia de 1000€ (Mil euros), sem realização de procedimento formal de contratação pública, com o fundamento de que os serviços prestados à população da Linha apenas tinham relevância para combater os efeitos psicológicos derivados da pandemia de Covid-19.

 Alegações da Associação dos Cabeleireiros da Linha

1.      Existência de corrupção na venda do “Paris em Linha”.

 

2.      Favorecimento de uma empresa de cabeleireiros, que tinha nascido sob a égide do município, não respeitando a concorrência.

 

Questões de Direito

1.      Inexistência de procedimento formal de contratação pública

A Associação de Cabeleireiros da Linha acusa a empresa municipal de não ter recorrido a um procedimento formal de contratação pública, contudo, apenas demonstram desconhecer o regime. Antes de aprofundar os artigos, explicaremos do que se trata este regime, que tem por objetivos: por um lado, dizer como é que os contratos públicos podem ser celebrados, estabelecendo as regras dos procedimentos que dão origem a um contrato público; por outro, disciplina, umas vezes de forma imperativa, outras vezes de forma supletiva, aspetos importantes da execução do contrato, nomeadamente as obrigações e os poderes das partes, o incumprimento, a modificação do contrato, etc.

 O Código dos Contratos Públicos regula os contratos celebrados por determinadas entidades; sendo elas as que estão taxadas nos artigos 2.º e 7.º, denominadas de “entidades adjudicantes”.

No fundo, estão sujeitos ao regime de contratação pública, os organismos da Administração Pública e outros, independentemente da sua natureza pública ou privada, cuja finalidade seja a da satisfação de necessidades de interesse público. Com isto, a Associação de cabeleireiros deve assumir que foi violado o dever de proceder a um procedimento formal de contratação pública mas, se atentarem no artigo 4º, n.º2, alínea c) do mesmo regime, perceberão que os contratos de compra e venda, são contratos excluídos. Quer isto dizer que não lhes aplicamos a mencionada regulamentação. Por outro lado, podemos aplicar-lhes o Código Civil, o regime para compra e venda de bens imóveis ou regimes específicos do município. 

 Os contratos de compra e venda encontram-se regulamentados nos artigos 874º a 939.º do Código Civil, e dizem respeito aos contratos pelo qual uma das partes (vendedor) se obriga a transferir a propriedade de uma coisa à contra-parte (comprador), que se obriga a pagar-lhe um determinado preço. Deste ponto de vista, a Linha Mais Próxima, como vendedores, procederam à realização do contrato, conforme os termos da lei. 

Deste modo, é um facto que as empresas municipais podem vender imóveis, mas esta venda está sujeita a regimes específicos de acordo com a legislação em vigor. Em Portugal, a alienação de bens imóveis por parte de entidades públicas, incluindo empresas municipais, é regulada por um conjunto de normas que visam assegurar a transparência e a legalidade do processo.

Assim sendo, as empresas municipais devem seguir os princípios da legalidade, transparência, publicidade e concorrência nos seus procedimentos de alienação de bens imóveis. Estes princípios são fundamentais para garantir que o processo seja conduzido de forma justa e equitativa.

  Este processo, ou seja, as vendas de imóveis por empresas municipais, quase sempre requerem a autorização dos órgãos competentes da entidade. No caso de empresas municipais, esta autorização geralmente é dada pelo conselho de administração, mas pode também necessitar de aprovação pela Câmara Municipal ou pela Assembleia Municipal, dependendo do valor do imóvel e das disposições legais específicas.

Pode-se ainda recorrer a legislação mais precisa para a execução deste procedimento, tal como o Regime Jurídico do Setor Empresarial Local, Lei nº50/2012 de 31 de agosto, que se aplica às empresas municipais, intermunicipais e metropolitanas. Este diploma define os princípios e regras para a gestão e alienação de bens das empresas do setor empresarial local. Para além deste, é possível ainda recorrer ao Decreto-Lei nº 280/2007, de 7 de agosto do Regime Jurídico do Património Imobiliário Público, onde é estabelecido o regime jurídico do património imobiliário público, aplicável às autarquias locais, entre outros.

De referir que, segundo o artigo 238º da Constituição da Républica Portuguesa, as autarquias têm património e finanças próprias, o que é justificado pelo facto de o Presidente da Câmara e o vereador responsável pela gestão da empresa alegarem que o processo foi justificado pela situação extraordinária que se verificava.

2.      Favorecimento da empresa de cabeleireiros “Paris em Linha”

Uma vez concluído que o procedimento da venda da antiga loja “Linha Mais Próxima”, agora, “Paris em Linha”, não se encontra submetido às exigências propostas pelo Código dos Contratos Públicos, a empresa municipal atua de forma livre e autónoma no procedimento da venda, tendo por isso optado por dar continuação ao projeto que tinha sido começado na época de Covid. A aquisição da loja e do respetivo equipamento foi feita tendo em vista a promoção do bem estar e autoestima da população numa época de grande fragilidade social, tendo a empresa municipal optado por dar continuação ao projeto que aí teria começado. Não houve a intenção de favorecer nenhuma empresa particular, apenas dar continuidade ao projeto, sendo que a opção pela venda foi feita de forma informada e imparcial, tendo em conta a associação de cabeleireiros e todos os salões do município. 

3.      Preço simbólico de Mil euros

O salão de cabeleireiros foi criado com o objetivo de “aumentar o bem-estar, a autoestima e a “alegria de viver” dos habitantes do Conselho” da Linha durante o tempo de pandemia, uma vez que não haveria outros serviços deste tipo no município devido à falta de equipamento especializado para evitar a transmissão de Covid-19. Trata-se de uma atuação de interesse público tal como está prevista no artigo 4º do Código do Procedimento Administrativo, de modo a combater os efeitos psicológicos da pandemia. Está em causa o “interesse geral de uma determinada comunidade, o bem comum” tal como o Professor Freitas do Amaral o descreve. A criação do salão não só respeita o princípio da prossecução do interesse público como ainda tem em conta o dever de boa administração – obrigação de adotar em relação a cada caso as melhores soluções possíveis e da forma mais eficiente (arts. 81º, c) da CRP e 5º do CPA). Desta forma a Administração viu uma oportunidade de manter um mínimo de sanidade mental (direito à integridade física, constitucionalmente protegido no art. 25º da CRP) de uma forma relativamente simples e eficiente.

Uma vez que a criação do salão tinha como justificação a existência da pandemia e a necessidade de “confortar” os munícipes que passariam por uma fase mais “depressiva”; com o fim da pandemia deixa de fazer sentido que este tipo de serviço seja assegurado por uma empresa pública uma vez que deixa de se enquadrar no princípio da prossecução do interesse público. Deste modo, faz sentido terminar esta função, vendendo a loja e o respetivo equipamento (bastante útil, ainda que a pandemia tenha “terminado”) a alguém que lhe possa dar uso. Não faria sentido que a empresa ficasse com um espaço e um equipamento que não necessita e aos quais não daria qualquer uso.

Assim, a venda da loja a um particular não tem qualquer objetivo lucrativo ou interesse comercial, visto que a Administração Pública não tem esse tipo de finalidade, mas sim a de zelar pelo melhor interesse da população atuando durante toda a transação de boa-fé (art. 10º do CPA). 

A decisão de venda teve por base a desnecessidade de continuação da atuação administrativa neste serviço, por isso, não faria sentido vender a loja e o respetivo equipamento por o mesmo preço que qualquer outro particular (com o intuito de ganhar uma vantagem com a venda).

O preço simbólico de venda não significa que a empresa municipal “Linha Mais Próxima” tenha recebido dinheiro sem que este tenha sido declarado (corrupção), mas sim que, tendo em conta a situação de inexistência de interesse na continuação da atividade, tenha havido alguma urgência na tomada de decisão uma vez que deixa de haver uma justificação plausível para a prestação de um serviço de cabeleireiro por um empresa municipal, uma vez que este tipo de serviços, só excecionalmente, é prestado por entes públicos. 

Porque é que a venda de uma loja e do respetivo equipamento por um valor de 1000€ (Mil euros) é automaticamente considerado como uma situação de corrupção e de falta de imparcialidade? Independentemente do particular que comprasse a loja, a venda teria sido realizada pelo valor de 1000€ (Mil euros), porque a empresa “Linha Mais Próxima” se rege e respeita veemente o princípio da imparcialidade consagrado no art. 9º do CPA. Mais! Exatamente devido ao respeito pelos princípios que determinam a atuação da Administração Pública, a boa administração da empresa pública é o motivo fundamental para que esta compra e venda se tenha realizado de forma célere, eficaz e pouco dispendiosa (art. 5º do CPA) para as partes nela envolvidas.

4.      Corrupção

A corrupção consiste em práticas antiéticas e ilegais realizadas com o objetivo de obter posições de poder, envolvendo a subversão de processos normais para obter benefícios indevidos. 

Neste caso, na celebração de contratos de compra e venda, a corrupção ocorre em situações em que estas práticas antiéticas constam no processo de negociação, celebração e/ou execução dos respetivos contratos. Afeta sobretudo, por norma, a transparência do processo, as regras claras e rigorosas que deveriam ser cumpridas, e a justiça e eficiência dos negócios celebrados. 

Relativamente ao caso em acusação, apesar de ser alegado por parte da Associação dos Cabeleireiros da Linha, a existência de corrupção e favorecimento de uma empresa de cabeleireiro “nascido sob a égide do município, em face das suas concorrentes”, esta não é de facto, real. A venda do edifício seguiu os trâmites necessários para a sua efetiva vinculação e os respetivos requisitos exigidos pela lei. 

O preço simbólico, como já explicado, deriva do facto de a venda ter sido realizada em plena boa fé por parte da “Linha Mais Próxima". Uma entidade que não tem em vista qualquer tipo de fins lucrativos. Uma vez que os interesses da utilização do espaço já não se verificavam, de nada servia perpetuar esta atuação que seria primeiramente exercida por entes privados. Deixamos de ter uma razão social para com a comunidade, e desse modo, torna-se desnecessário ter esta propriedade nas mãos do município, num projeto desatualizado. Para além disso, podemos considerar insensato manter estas despesas de manutenção do espaço, bem como do material adquirido para a atividade. Despesas estas que acabariam por não ser colmatadas pelos lucros do estabelecimento a partir do momento em que todos os outros estabelecimentos de serviços idênticos reabriram com o levantar das restrições inerentes à pandemia, provocando um gasto público maior e, mais uma vez, desnecessário. Aliás, o desaparecimento do motivo que levou à constituição desta empresa, levou a que, caso se mantivesse o negócio, este representaria uma violação ao artigo 20.º, nº. 1 e 2 do Regime Jurídico da Atividade Empresarial Local e das Participações Locais. Onde se afirma que “é proibida a constituição de empresas locais para a prossecução de atividades de natureza exclusivamente administrativa ou com o intuito exclusivamente mercantil”, ou seja, continuar com esta empresa sem necessidade para tal, é que seria uma verdadeira corrupção.

Também o procedimento de venda que foi acusado de ser viciado, está de acordo com os termos da lei, ou seja, consoante o Código Civil. Deste modo, o processo foi totalmente justificado.

Assim, e concluindo, apresentamos razões que evidenciam não só a utilidade da venda, bem como a sua necessidade perante a lei.

Alegações finais

Ainda que os senhores juízes considerem que houve problemas nesta venda – coisa que negamos – é impensável alegar a invalidade de um contrato que não está sujeito ao Código de Contratos Públicos e que, por isso, não carece de qualquer procedimento formal.

O Direito Administrativo visa a proteção dos direitos dos particulares. O limite superior e inferior de todos os princípios que regem a atividade administrativa são os direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos (art. 266º/1 da CRP), portanto, é insustentável que se considere que esta venda seja anulada em detrimento de um direito concedido e reconhecido até agora ao particular em causa.

Ora, retirar a um cidadão o seu direito à propriedade (consagrado no art. 62º da CRP) torna-se não só ilegal como inconstitucional, portanto, parece-nos que nenhuma decisão deste tribunal possa permitir tal desfecho.

Posto isto, é de ressalvar a extrema importância de olhar para os factos tais como eles aconteceram e não partir de alegações falsas para deturpá-los.



Ana Beatriz Martinho

Luana Gama

Maria Inês Lemos

Matilde Loios

Teresa Nogueira

 

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