Simulação (Grupo I): Advogados ACL - criação do salão de cabeleireiro "Paris em Linha"

Introdução: 

Em representação da Associação dos Cabeleireiros da Linha (ACL), consideramos inválidas todas as ações do executivo camarário e da 

respetiva empresa municipal, nomeadamente a primitiva configuração deste salão “Paris em Linha” e a sua criação pelo que, vimos pedir declaração das devidas consequências. Desta forma, esta acusação visa garantir o reconhecimento do direito dos particulares que foram de forma manifesta violados devido à ação administrativa. A Câmara Municipal da Linha decidiu instalar um salão de cabeleireiro tendo adquirido equipamento especial, como fardas especiais imunizadoras. Para além disso, a câmara através da empresa municipal “Linha mais Próxima” assegurava a cedência do edifício, a compra em cima referida, e ainda o pagamento dos salários de uma equipa de 30 cabeleireiros (empresa Revivre Paris Ailleurs que terá sido constituída para o efeito). 

O art.º 266/1 CRP consagra que a administração pública deve prosseguir o interesse e os direitos dos cidadãos sendo que a administração, os seus órgão e os seus agentes, segundo o art.º 266/2, estão de forma vinculativa subordinados à Constituição e à lei no exercício das suas funções. No caso presente esta vinculação foi ignorada de forma violenta.

A administração pública tem sempre que respeitar as normas que definem o procedimento administrativo. O art.º 2/1 CPA define que as disposições sobre o procedimento e atividade administrativa são aplicáveis à conduta de quaisquer identidade administrativa, independentemente da sua natureza. Para além disso, o nº 3 do mesmo artigo estipula que o legislador ordinário está vinculado aos princípios gerais da atividade administrativa (art.º 3 a 19 CPA) e aos preceitos constitucionais (art.º 266 CRP) em toda e qualquer atuação da administração pública. 

Assim, tanto a Câmara Municipal, como a Empresa Municipal, como a Empresa Revivre Paris Ailleurs integram a administração pública, art.º 2/4 estando sujeitos a estes princípios e leis que foram desrespeitados. O art.º 4/2 CPA não inclui expressamente empresas públicas na administração pública. Contudo, estas estão incluídas por força do disposto do art.º 2/1 que estende a aplicação dos dispositivos respeitantes aos princípios gerais, procedimento e atividade administrativa à conduta de quaisquer identidades, independentemente da sua natureza. Contudo, o CPA é aplicado dependendo do género da conduta adotada. Como no caso esta corresponde a uma conduta adotada no exercício de poderes públicos e regulada de modo específico por disposições de direito administrativo, o CPA é aplicável (Acórdão do Tribunal Central Administrativo nº 1872/175). 

Adicionalmente, e tendo em conta o princípio da legalidade previsto no art.º 3 CPA, as “medidas extraordinárias” tomadas pela administração não possuem uma norma habilitante o que viola de forma direta estes assuntos. “A demonstração e a prova desta violação será o principal objetivo desta acusação”. 



A instalação do cabeleireiro enquadra-se nas atribuições típicas de um município? 


Os Municípios são pessoas coletivas públicas de cariz territorial, defendendo os interesses locais da comunidade.  Estes possuem uma grande autonomia face à administração central do Estado, dessa forma o Município da Linha não será diferente, essa liberdade advém do facto de a  grande maioria das suas atribuições não estarem limitadas por uma listagem taxativa, e serem deixadas ao critério do Presidente e dos vereadores municipais.

Os municípios poderão possuir uma estrutura municipal, materialmente considerada, dividindo-se em serviços municipalizados e empresas municipais.  Uma vez que o caso nos diz que a Câmara através da empresa municipal “Linha Mais Próxima”, a assegurava, para além da cedência do edifício e da compra do equipamento referido, também o pagamento dos salários de uma equipa de 30 cabeleireiros, da empresa “Revivre Paris Ailleurs”. Importa analisar , se tal está abrangido pelas competências que possui uma empresa municipal.

Tal como defende o professor Freitas do Amaral , as empresas locais apenas poderão ser constituídas caso o seu objeto social exclusivo consista na exploração de atividades de interesse geral ou na promoção do desenvolvimento local e regional, logo está proibida a constituição de empresas municipais para a prossecução de fins de natureza exclusivamente administrativas ou com um intuito exclusivamente mercantil (art 20 nº1 RSEL) . Desta forma , podemos concluir que as empresas municipais estão sujeitas a um princípio de tipicidade do seu objeto, logo apenas podem prosseguir as atividades as atividades que se encontram previstas na lei , nos arts 20 nº1 ; 45 e 48 RSEL .

Facilmente concluímos que a criação de uma empresa municipal com o intuito de assegurar a “ (...) cedência do edifício e da compra do equipamento referido, também o pagamento dos salários de uma equipa de 30 cabeleireiros, da empresa “Revivre Paris Ailleurs(...)”. Extravasa por completo a letra dos arts arts 20 nº1 ; 45 e 48 RSEL , e dessa forma a criação desta empresa municipal é irregular.



A atuação da administração pública num estado de emergência (Covid 19)


No caso também é importante termos em conta que nos encontrávamos nos  num período de pandemia. Logo, é necessário analisar esta atuação da Administração Pública, sem pleno respeito pelas formas legais do procedimento em Estado de Emergência. 

Primeiramente, o Estado de Emergência é a situação onde a lei permite à Administração uma atuação imediata e urgente com vista à salvaguarda de bens essenciais e prosseguir o interesse público, mesmo que para isso seja necessário ignorar o respeito estabelecido pelas normas. Assim, o art.º 3/2 CPA e o art.º 19 e art.º 266 CRP constituem o afloramento de um princípio geral de direito administrativo , ou seja, a exclusão de ilicitude nestes casos. Contudo, para existir esta exclusão de ilicitude por parte da atuação da Câmara Municipal e da Empresa Pública, é obrigatório que se verifiquem os seguintes pressupostos: situação de autêntica necessidade de resolver; natureza imperiosa do interesse público a resolver; excepcionalidade da situação; ausência de alternativas menos gravosas (princípio da proporcionalidade). 

A nosso ver, é bastante claro que a criação de um cabeleireiro não se inclui nestes pressupostos. É verdade que nos encontrávamos no período excecional, mas não faria sentido, em prol do interesse público, a criação de um cabeleireiro num cenário de pandemia. 

 

Princípio da proporcionalidade no estado de emergência - art.º 19/4

 

Segundo o art. 266.º/2 da CRP, a administração pública deve decidir de forma a prejudicar o menos possível os interesses privados, respeitando o interesse público que está em causa.A pandemia provocada pelo coronavírus em 2020 fez com que Portugal se visse pela primeira vez confrontado com a exceção constitucional do Estado de Emergência.  

  Este Estado de Emergência tem, necessariamente de respeitar, o princípio da proporcionalidade e especificar claramente os direitos, liberdades e garantias cujo exercício fica suspenso. Efetivamente, ao abrigo do art.º 19/4 da CRP, “A opção pelo estado de sítio ou pelo estado de emergência, bem como as respectivas declaração e execução, devem respeitar o princípio da proporcionalidade e limitar-se, nomeadamente quanto às suas extensão e duração e aos meios utilizados, ao estritamente necessário ao pronto restabelecimento da normalidade constitucional”. 

  O princípio da proporcionalidade, como pilar essencial do direito público, desempenha um papel crucial na avaliação e no equilíbrio entre os meios utilizados e os objetivos pretendidos em diversas áreas. A aplicação deste princípio implica uma análise meticulosa da necessidade, adequação e proporcionalidade das ações adotadas, garantindo que estejam em sintonia com os fins almejados, sem impor ónus desnecessários ou desproporcionais aos direitos individuais e bem-estar coletivo. 

  Aplicando as três vertentes essenciais do princípio da proporcionalidade: 1. Necessidade: 2.  Adequação: 3. Proporcionalidade em sentido estrito: num contexto global, especialmente durante a pandemia de Covid-19, o princípio da proporcionalidade destacou-se como um instrumento fundamental na avaliação das medidas restritivas adotadas para conter a propagação do vírus e proteger a população. A análise, embora complexa, revela um delicado equilíbrio entre a proteção da saúde pública e os impactos socio-económicos. 

  Numa primeira abordagem, é facilmente considerável que a medida adotada pela Câmara Municipal desrespeita o princípio da proporcionalidade em sentido estrito que implica uma proporção entre as vantagens decorrentes da prossecução do interesse público e os sacrifícios inerentes dos interesses privados. A criação do salão pode impor ónus significativos aos cofres públicos, sem necessariamente proporcionar benefícios proporcionais à população afetada pela pandemia. 

Além disso, existem certamente outros meios bastante mais eficazes para promover o “bem-estar” e a “autoestima da população” durante o estado de emergência, e que não impliquem tantos riscos associados como a criação de um cabeleireiro que, para pela procura de uma vantagem para a sociedade, acaba por criar também muitas desvantagens associadas com os riscos que podem resultar deste tipo de atividade numa situação pandémica. 

Assim, procurando alternativas menos intrusivas e consideravelmente mais adequadas, em vez de criar um salão de cabeleireiro financiado pelo governo, a Câmara Municipal poderia direcionar recursos para programas de apoio social, serviços de saúde mental ou iniciativas de promoção do bem-estar comunitário, que podem alcançar um impacto mais amplo e ser mais adequados à situação de emergência.



Princípio da prossecução do interesse público

 

O Presidente da Câmara e o vereador responsável pela gestão da empresa “Linha mais Próxima”, alegam que a respetiva atuação respeitou sempre as atribuições e competências dos municípios, para além de ser plenamente justificada pela situação de pandemia. 

Porém, esta alegação afigura-se bastante questionável, nomeadamente pela existência do princípio fundamental da prossecução do interesse público que, por mais que esta medida possa de certa forma beneficiar a população, não pode deixar de ser considerada. 

  Segundo o art.º 266 da CRP, “a administração pública visa a prossecução do interesse público, no respeito pelos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos”.  

Focando-nos concretamente naquilo que é o interesse público. Por um lado, podemos concretizá-lo como o interesse coletivo, o interesse geral de uma determinada comunidade. Por outro lado, pode ser caracterizado como a exigência de satisfação das necessidades coletivas-vitais para a comunidade no seu todo.

Um dos corolários desse princípio é o facto de ser a lei que define os interesses públicos a cargo da Administração, ou seja, não pode ser definido de forma livre - é necessário que seja habilitado pela lei o que sempre seria bastante questionável no caso em análise. 

Para além disso, a obrigação de prosseguir o interesse público exige que a administração adote no caso concreto a melhor solução possível do ponto de vista administrativo que engloba, evidentemente, o setor técnico e financeiro. A isto se chama o dever de boa administração

Face a isto, torna-se bastante questionável se a aquisição de equipamentos especializados e o pagamento dos salários de uma equipa de 30 cabeleireiros da empresa “Revivre Paris Ailleurs” (constituída especificamente para o efeito) vai efetivamente ao encontro do respeito por este princípio fundamental. Na verdade, essas medidas podem implicar um grande gasto de recursos públicos, principalmente se não houver uma explicação convincente de que essa iniciativa é a maneira mais adequada e efetiva de melhorar o bem-estar da população. 

  Os interesses públicos cuja satisfação cabem à administração pública no desempenho da função administrativa têm de ir ao encontro daquilo que seja mais essencial para a obtenção do bem comum da comunidade, pelo que englobam essencialmente setores como a segurança pública, a educação, a saúde pública, a cultura e os transportes coletivos. Desta forma, os recursos públicos deveriam ser utilizados de forma prudente e responsável, priorizando investimentos em áreas prioritárias e serviços essenciais, o que não parece ser o caso da criação de um cabeleireiro, sobretudo face a uma situação de calamidade pública.  

No entanto, cabe sublinhar que a criação do cabeleireiro pela Câmara Municipal pode ser uma intervenção negativa na economia local, competindo talvez e provavelmente com cabeleireiros existentes, o que distorce a concorrência e prejudica a iniciativa privada.


A contratação pública em relação aos trabalhadores da empresa “Revivre Paris Ailleurs”: 

O Código dos Contratos Públicos (CCP) estabelece diretrizes claras que as autarquias devem seguir na contratação pública. Segundo o artigo 20º do CCP, as câmaras municipais devem abrir um concurso público para a celebração de contratos de locação, aquisição de bens móveis e aquisição de serviços. 

Existem várias formas de procedimento, como o concurso público e o concurso limitado por prévia qualificação, que podem, ou não, ser anunciados no Jornal Oficial da União Europeia. Alternativamente, podem optar por uma consulta prévia, envolvendo no mínimo três entidades para contratos abaixo de 75000 euros, ou por um ajuste direto para contratos até 20000 euros.

O ajuste direto, conforme detalhado no artigo 112º, nº 2 do CCP, é uma modalidade mais restrita, onde a entidade pública convida diretamente uma empresa específica para apresentar uma proposta. Este método é tipicamente reservado para acordos de menor valor econômico e é justificado pela necessidade de agilidade ou por especificidades do serviço ou bem a ser contratado. No entanto, segundo os artigos 24º, 26º e 27º do CCP, uma câmara municipal que opte pelo ajuste direto sem cumprir as condições estipuladas estaria em desconformidade com o artigo 20º do CCP.

       Segundo o Professor Marcelo Rebelo de Sousa, o caráter de gestão pública convoca um dos mais complexos problemas da teoria do contrato administrativo, o da sua eventual distinção em face dos contratos de direito privado da administração.

  • O princípio da igualdade garante um tratamento uniforme a todos os interessados que apresentem condições objetivamente idênticas relativamente à capacidade de execução das prestações contratuais. 
  • O princípio da concorrência visa maximizar a participação de candidatos nos procedimentos de contratação, interpretando as regras de maneira a facilitar, e não restringir, a competição.

  • O princípio da transparência exige que todas as decisões tomadas sejam claras e bem fundamentadas para que sejam compreensíveis por todos os envolvidos. O art. 315.º CCP fala do princípio numa obrigação de transparência, que a lei faz recair sobre o contraente público.

  • O princípio da boa-fé: Os artigos 76.º, 79.º e 105.º CCP dispõe o principal corolário no que se refere à contratação pública. 

  • O princípio da colaboração recíproca (art. 289.º) estipula o dever de se informar mutuamente acerca de tudo quanto releve no âmbito da execução do contrato. 

  • Princípio da conexão material e da proporcionalidade das prestações contratuais: Este preceito foi revogado pelo CCP – ditava a impossibilidade de o contraente público impor aos contraentes prestações desprovidas de ligação ao objeto do contrato ou que se revelassem desproporcionais. O art. 281.º CCP, que lhe sucedeu, demonstra uma resposta mais equilibrada às preocupações do legislador – o contraente público não pode assumir direitos manifestamente desproporcionados ou que não tenham uma conexão material direta com o fim do contrato. A ideia de proporcionalidade está presente no art. 303.º/2 CCP, que dispõe que a propósito de poderes de direção e fiscalização do contraente público, que estes devem salvaguardar a autonomia do co contraente, limitando-se ao estritamente necessário à prossecução do interesse público, e no art. 283.º/4 CCP, em matéria da invalidade do contrato. 

Desta forma, constata-se que há uma violação clara dos procedimentos administrativos – nenhuma das opções administrativas foi seguida e, sendo o único possível, o ajuste direto, também não se enquadra. O fraco cumprimento legislativo e a violação dos princípios constitucionais são evidentes. 

Com base nestas informações, fica evidente que as regras de contratação foram descumpridas, tanto no procedimento escolhido quanto na aplicação dos princípios jurídicos e constitucionais, revelando falhas significativas na aderência ao CCP.

Poder-se-á falar no DL 10-A/2020, de 13 de março, que apresenta medidas de contratação pública excepcionais e temporárias relativamente ao período do COVID-19. Contudo, permite-se a celebração de contratos na sequência de ajuste direto em situações de emergência – podemos constatar que um cabeleireiro não se enquadra nesta figura (como, por exemplo, um centro de saúde ou um estabelecimento para a vacinação). 


A criação do cabeleireiro respeitou o procedimento administrativo?


Face a tudo o que foi exposto e as suas respectivas consequências, é importante ainda verificar que o procedimento administrativo foi perentoriamente violado. 

Tal como define o professor Freitas do Amaral, o procedimento administrativo é a sequência juridicamente ordenada de atos e formalidades, respeitando prazos, tendentes à preparação e exteriorização da prática de um ato, último e desejado, da administração ou à sua execução. Nesta situação, o procedimento foi ignorado ilicitamente em dois momentos distintos. 

Este procedimento, se tivesse sido realizado, estaria incluído na categoria dos Procedimentos de Iniciativa Pública Comuns, pois seria a administração quem, a priori, tomaria a iniciativa de desencadear.  Por sua vez, tendo em atenção o critério do objeto, seria um procedimento decisório, pois a Camara da linha tinha o objetivo de preparar um ato da Administração.

Importa agora analisar as 6 fases do procedimento administrativo , segundo o professor Diogo Freitas do Amaral: fase inicial; fase da instrução; fase da audiência dos interessados; fase de preparação da decisão; fase de decisão; fase complementar.

1. Fase Inicial: Desencadeia o procedimento administrativo, podendo surgir de iniciativa pública ou privada, art.º 53 CPA. Dada a situação em causa, uma que era a Administração tinha interesse em desencadear este processo, devia tê-lo comunicado à Associação dos Cabeleireiros de Linha, bem como aos cidadãos do município, pois os seus direitos e interesses legalmente protegidos foram manifestamente lesados, com a criação do Salão. 

Nesta situação, consideramos que foi colocado em causa certos poderes jurídicos dos particulares que são uma forma de proteção ou defesa contra os abusos e ilegalidades da Administração Pública, esta proteção tem o nome de  garantias dos particulares.

Tal como o professor Freitas do Amaral, consideramos que existem três classificações de garantias: por um lado, garantias preventivas (ou a priori) e garantias reparadoras (ou a posteriori); por outro, garantias do direito objetivo e garantias dos particulares; e,  por fim, as garantias de legalidade e garantias de mérito. 

Neste caso,  está em causa uma manifesta violação das garantias dos particulares, pois não se teve em conta os direitos subjectivos e os interesses legítimos dos particulares contra as atuações da Administração Pública que os prejudiquem.

2. Fase de Instrução: Nesta fase, tem como objetivo principal a averiguação dos factos que interessem à decisão final (art.º 115 a 120 CPA) e que se rege pelo princípio do inquisitório, art.º 58 CPA , isto é , a Administração, sem a necessidade da vontade dos interessados, requer factos e esclarecimentos que mais facilmente levam à tomada da melhor decisão,

A direção do procedimento cabe ao executivo da Câmara Municipal, pois é o órgão competente para a decisão final (concessão da utilização e exploração do domínio público).

3. Fase da Audiência dos Interessados: Nesta momento , deveriam estar presentes  os princípios da colaboração da Administração com os particulares (art.º 111 CPA) e da participação (art.º 12), tendo a Audiência dos Interessados dignidade Constitucional art.º 267/5 CRP  e na parte final do disposto do art.º 2 CRP. Os interessados deviam ter sido ouvidos no procedimento, antes de ser tomada a decisão final, podendo fazer quer de forma oral ou escrita, cabendo a escolha ao diretor do procedimento no exercício do seu poder discricionário consagrado no disposto do art.º 122/1 CPA. A falta de audiência prévia dos interessados, tem como consequência a nulidade do ato, nos termos do disposto do art.º 161/2/d CPA, pois é um direito fundamental dos particulares, algo que não aconteceu ,estamos perante mais uma irregularidade no processo de criação do cabeleireiro. Importa sinalizar , que nesta situação, está completamente excluídas as situações de dispensa presentes no art.º 124 CPA.

4. Fase da preparação da decisão: Nesta fase, a administração deveria ter ponderado o quadro traçado na fase inicial, a prova recolhida na fase de instrução e os argumentos apresentados pelos particulares na fase da audiência dos interessados. Posteriormente, seria levado ao órgão colegial que emitiria uma deliberação, nos termos dos art.º 125 e 126 CPA. Contudo, nada foi cumprido, tal como já podemos observar nas fases posteriores .   

5. Fase de Decisão: Este é o momento em que todo o procedimento administrativo chega ao fim, tal como indica o art.º 93 CPA. Este pode terminar pela prática de um ato administrativo ou pela celebração de um contrato (art.º 126 CPA), salvo disposição em contrário. Esta situação teria terminado pela prática de um ato administrativo, e todas as questões pertinentes que não tiveram a hipótese de serem colocadas, deviam ser alvo de resolução pelo órgão competente, como dispõe o art.º 94/1 CPA.


Conclusão

Face ao exposto, concluímos que a criação do salão de cabeleireiro “Paris em Linha” pela Câmara Municipal da Linha, em parceria com a empresa municipal “Linha mais Próxima” e a empresa Revivre Paris Ailleurs, apresenta várias irregularidades jurídicas e administrativas. Primeiramente, constatamos a falta de cumprimento das fases essenciais do procedimento administrativo, que deveriam garantir a legalidade e a transparência das ações administrativas. Este incumprimento evidencia a violação dos direitos e interesses legalmente protegidos dos particulares, destacando-se a ausência de audição prévia dos interessados, o que constitui um direito fundamental.

Além disso, a atuação administrativa questionável é exacerbada pela natureza da criação da empresa municipal Revivre Paris Ailleurs, que ultrapassa o escopo legalmente permitido para as empresas municipais, conforme disposto nos arts. 20 nº 1, 45 e 48 do RSEL. Essa empresa foi constituída para fins administrativos e mercantis que não se enquadram nas atividades de interesse geral ou de promoção do desenvolvimento local e regional.

No contexto da pandemia de COVID-19, embora se reconheça a necessidade de medidas urgentes e extraordinárias, estas devem respeitar os princípios da proporcionalidade e da legalidade. A criação do cabeleireiro não se justifica como uma medida de necessidade imperiosa ou como uma resposta proporcional à situação pandémica. Outras iniciativas poderiam ter sido mais adequadas e eficazes para atender às necessidades da população durante a emergência sanitária.

Finalmente, a contratação pública dos trabalhadores da empresa Revivre Paris Ailleurs revela falhas significativas no cumprimento do Código dos Contratos Públicos (CCP), particularmente na escolha do procedimento de ajuste direto, que não se adequa ao contexto e não respeita os princípios da igualdade, concorrência e transparência. Mesmo considerando as medidas excepcionais de contratação pública durante a pandemia, previstas no DL 10-A/2020, a criação e financiamento de um cabeleireiro não se enquadram nas situações de emergência que justificariam tais ajustes diretos.

Portanto, as ações da Câmara Municipal e das empresas envolvidas configuram uma série de violações legais e administrativas que comprometem a legitimidade do processo e a proteção dos direitos dos particulares, bem como a adequada gestão dos recursos públicos. Desta forma, face a todos os vícios enumerados, este ato administrativo é inegavelmente nulo. 

Bibliografia 

Caupers, J. - Introdução ao Direito Administrativo

Freitas do Amaral, D- Curso de Direito Administrativo (Vol. II) 

Acórdão do Tribunal Central Administrativo nº 1872/175

Rebelo de Sousa, M., & Salgado de Matos , A-  Direito Administrativo Geral (Dom Quixote , Ed.)

Otero , P.-  Legalidade e Administração Pública


Sub Turma 14: 

Ana Luísa Rocha

Beatriz Sacramento

Bernardo Catarino 

Constança Neves 

Margarida Shirley Silveira


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